Jornal “Correio da Manhã”,
30 de junho de 2003.
Opinião
Helder João Fráguas*
Actualmente, é muito mais
fácil carregar o saldo do telemóvel, numa caixa multibanco.
Já não são necessários os números relativos à
entidade e à referência.
Tudo o que há a fazer é escolher o operador e
inscrever o número do telefone.
A filha de um amigo meu pediu ao pai que lhe
carregasse o saldo do seu telemóvel. O problema é que passaram-se horas e não
havia meio de o saldo ficar actualizado.
Ele foi então verificar o talão da caixa. Verificou
que se tinha enganado ao digitar um algarismo. Tinha feito um carregamento para
outro telemóvel, cujo dono, embora surpreendido, deve ter ficado todo feliz.
O meu amigo ligou para a assistência ao cliente.
Disseram-lhe que nada havia a fazer. O lapso era imputável a ele e, portanto,
era impossível proceder a qualquer rectificação.
Ele contou-me o episódio acidentalmente e com ar
resignado. Eu expliquei-lhe que alguma coisa estava mal naquele procedimento.
Ao adoptarem este novo sistema de carregamento, os operadores já deveriam ter
previsto que a probabilidade de existir um erro aumenta com a simplificação do
procedimento.
Havia que dar formação adequada aos assistentes,
ensinando-lhes o que fazer nestas situações.
Admito que, no caso em apreço, tal não tenha sido
realizado. A assistente, que atendeu o meu amigo, terá decidido ela própria,
por auto-recriação, que nada haveria a fazer nesse caso. Ao invés, deveria ter
tomado nota da reclamação e expô-la aos seus superiores.
Não quero acreditar que tenham existido algumas
instruções, no sentido de os assistentes informarem os clientes que, em caso de
lapso, não há solução. É que, do ponto de vista legal, as coisas não se passam
assim.
O que sucede é um erro na declaração de vontade
por parte de quem procede ao carregamento.
Para quem é beneficiado com o carregamento que não
lhe era destinado, existe um enriquecimento sem causa. São tudo situações
previstas no Código Civil, que consagra a justa solução para o caso: a
devolução do dinheiro a quem, por lapso, carregou o telemóvel de outrem.
Espero que seja dada a devida atenção a casos
futuros, salvaguardando os direitos dos consumidores, que, felizmente, são cada
vez melhor defendidos.
Figuras como Beja Santos, Mário Frota, João Nabais
ou Joaquim Carrapiço têm dado um valioso contributo para que os clientes sejam
respeitados no que concerne às transacções em que diariamente estão envolvidos.
A Associação Portuguesa de Direito do Consumo, a DECO, a Associação dos
Consumidores de Portugal e o Instituto do Consumidor são as principais
entidades a quem podemos recorrer no caso de nos sentirmos prejudicados.
Também a comunicação social tem desenvolvido um
importante trabalho, ao divulgar casos reais de empresas que não adoptam um
comportamento correcto, esclarecendo se o litígio foi ou não resolvido. É o que
faz, por exemplo, a revista "Mulher", distribuída às sextas-feiras
com o Correio da Manhã, na rubrica "Os Seus Direitos".
Do mesmo modo, na Internet existe um ‘site’
utilíssimo, que se localiza em www.queixas.co.pt. Aí são registadas as
reclamações apresentadas pelos consumidores e as eventuais respostas das
empresas postas em causa. Este instrumento é precioso para quem pretende
apresentar uma queixa, mas também para aqueles que querem avaliar a atitude dos
agentes económicos que actuam no mercado. Antes de fazer uma compra, vale a
pena fazer uma consulta e ver o que se diz a propósito da firma com quem vamos
negociar.
Muitos municípios contam com um relevante
organismo na Câmara Municipal, denominado Centro de Atendimento e Informação ao
Público (CAIP). Para resolução de pequenos litígios com entidades situadas na
nossa área de residência, este meio é ideal.
*Juiz
( h j f r a g u a s @ h o t m a i l . c o m )