Jornal "Correio da Manhã",
5 de maio de 2003
Nem
toda a gente tem meios económicos para recorrer a um advogado.
Para
obviar a tal dificuldade, existe o apoio judiciário.
Este
divide-se em três grandes áreas: informação jurídica, consulta jurídica e
patrocínio judiciário.
A
informação é essencial. Se os cidadãos não conhecem os seus direitos, nem
sequer chegam a recorrer a uma consulta jurídica. Por exemplo, é importante
informar que no caso de haver uma falha de fornecimento de electricidade e
forem causados danos, o lesado tem o direito de pedir uma indemnização à EDP
(que, aliás, dispõe de um seguro para o efeito). Imagine-se que se estraga
carne congelada ou que se avaria um aparelho eléctrico. O prejuízo deve ser compensado.
A
consulta jurídica é o passo seguinte. Tendo noção de que lhe assiste um
direito, o particular deve consultar um advogado. Se não dispuser de meios, tem
direito a uma consulta jurídica gratuita. O jurista aconselhá-lo-á sobre o
caminho a adoptar.
Finalmente,
importa assegurar o patrocínio judiciário. Quando há um litígio em tribunal, a
parte interessada deve ser representada por advogado. Mais uma vez, se sofrer
de carências económicas, deve ser nomeado um causídico, cuja retribuição será
assegurada pelo Estado.
Além
disso, caso se justifique, deve o interessado ficar dispensado de pagar a taxa
de justiça.
Durante
muito tempo, o apoio judiciário foi incipiente e praticamente consistia na
nomeação oficiosa de advogado ou advogado estagiário que recebia uma
remuneração absolutamente irrisória, chegando-se até ao seguinte absurdo: no
caso de o réu ser absolvido, o profissional do foro nada recebia. A informação
jurídica e a consulta jurídica eram miragens.
Em
1987, foi institucionalizado um sistema de apoio judiciário sólido, que
permitiu satisfazer as necessidades dos mais carenciados.
Algumas
dificuldades foram-se fazendo sentir ao longo da vigência deste sistema.
O
apoio judiciário centrava-se em decisões do juiz da comarca. Perdia-se tempo
com averiguações e pedido de parecer ao Ministério Público. O magistrado
judicial acabava por desempenhar um papel que nada tem que ver com a sua
função, que é a de proferir decisões sobre litígios ou a eventual prática de
crimes.
O
esquema de remunerações aos advogados era também complexo e mais uma vez
excessivamente dependente do critério do juiz, que atribuía honorários dentro
de certos limites, sem que realmente dispusesse de elementos que lhe
permitissem fazer um cálculo adequado. Abria-se o flanco a críticas. Recordo-me
de um advogado uma vez me dizer que certo juiz conferia melhores remunerações a
jovens e esbeltas advogadas do que aos seus colegas do sexo masculino. A
observação era provavelmente injusta, mas demonstrava que os juízes se expunham
desnecessariamente em função de se verem forçados a tudo decidir em matéria de
apoio judiciário.
Em
2000, o sistema de apoio judiciário foi reformulado. Grande parte dos pedidos
de apoio judiciário passaram a ser tratados nos serviços da Segurança Social,
organismo com muito mais sensibilidade para aferir da carência económica de um
indivíduo.
Decorrido
algum tempo sobre a criação do novo sistema, verificaram-se algumas falhas,
tendo assumido dimensões preocupantes os atrasos no pagamento aos defensores.
Importava
de novo repensar o esquema de apoio judiciário.
Em
boa hora, foi decidido criar o Instituto de Acesso ao Direito, a funcionar sob
a égide da Ordem dos Advogados. A Segurança Social continuará a apreciar se o
cidadão se encontra em situação de carência económica, mas todo o processo de
apoio judiciário competirá a este novo organismo, com vocação específica para o
assunto.
Estou
seguro de que quem, por necessidade económica, recorrer ao novel Instituto de
Acesso ao Direito será melhor servido.