Jornal "Correio da Manhã",
14 de julho de 2003
Em Inglaterra, saiu
da cadeia o multimilionário Lorde Jeffrey Archer. Ele esteve à beira de ser
primeiro-ministro do seu país, até que rebentou um escândalo sexual. Já
reabilitado, foi designado candidato do Partido Conservador à Presidência da
Câmara de Londres, mas veio a desistir devido a acusações de prática de crimes.
Mesmo
a propósito, foi lançada a versão portuguesa do seu diário da prisão,
intitulado FF8282, o número de prisioneiro que lhe coube em sorte.
Jeffrey
Archer foi condenado a quatro anos de prisão. No dia 19 de Julho de 2003,
completou dois anos de cárcere, o que lhe permite gozar de liberdade condicional,
já concedida, por ter cumprido metade da pena.
Como
o dia 19 calhou a um sábado, só lhe foram abertas as portas da cadeia na
segunda-feira seguinte.
A
lei criminal portuguesa, de tradição humanista, é mais generosa. Se o dia da
libertação coincide com o fim-de-semana, o preso sai na sexta-feira. Caso
recaia no dia 24 ou 25 de Dezembro, é libertado a 23, de manhã.
Archer
começou a sua carreira política muito cedo. Aos 29 anos, era dos deputados mais
jovens da Grã-Bretanha. Em 1974, demitiu-se devido à falência de uma empresa
canadiana, da qual era accionista. Enquanto esteve no Canadá, para depor em
tribunal, foi detido por suspeita de furto numa loja, embora nunca tivesse sido
acusado formalmente.
Dedicou-se,
então, a escrever romances, que totalizaram mais de cem milhões de vendas em
todo o mundo. As suas obras, excepcionalmente, interessantes, têm sido
publicadas em Portugal. Destacam-se “Caim e Abel”, “O Quarto Poder” e “Erro
Judicial”, que deveria ser lido por todos os juristas. Archer fez fortuna com a
sua actividade literária.
Em
1985, voltou a entrar na política, pela porta grande. Nos tempos áureos de
Margareth Thatcher, foi nomeado Vice-Presidente do Partido Conservador. Já se
sabia que, no futuro, ele iria substituir a dama de ferro no cargo de
primeiro-ministro.
Um
ano depois, o jornal “Daily Star” publicou uma extensa reportagem, relatando um
encontro deste político com uma prostituta, a quem ele teria pago para que ela
se mantivesse em silêncio quanto ao relacionamento entre ambos.
Jeffrey
Archer demitiu-se de todos os cargos.
Mas
processou o diário. No julgamento, o seu amigo Ted Francis forneceu um alibi
perfeito. Os dois tinham estado juntos à hora apontada pelo jornal como sendo a
do encontro com a prostituta. Archer recebeu o equivalente a 340000 euros de
indemnização.
Em
1992, foi agraciado com o título de Lorde.
Decorridos
sete anos, preparava-se para concorrer ao cargo de Presidente da Câmara de
Londres, quando se descobriu que afinal o tal alibi era falso. Francis, que
entretanto cortara relações com o seu antigo amigo, tinha mentido em tribunal.
O
Lorde Jeffrey Archer foi condenado a quatro anos de prisão, pela prática de
dois crimes de perjúrio e um de obstrução à justiça. Para além de ser obrigado
a devolver a indemnização ao jornal, claro.
Agora,
vai sair em liberdade condicional, apesar da sua permanência na cadeia ter sido
marcada por alguns incidentes.
Certa
vez, na cantina, foram servidas salsichas com batatas cozidas. Jeffrey Archer
levantou-se e disse em voz alta, para que todos ouvissem:
-
É isto o jantar? Onde é que está o caixote do lixo?
E
deitou mesmo a comida fora.
Noutra
ocasião, foi-lhe permitida uma saída precária para visitar a família. Mas o
preso aproveitou para participar numa luxuosa festa na casa de um deputado.
A própria publicação do seu diário foi controversa. Os serviços prisionais consideraram que tal constituía violação das regras dos detidos e cancelaram-lhe algumas regalias de alimentação.